Fundação do PT no colégio Sion em SP. Lula é o terceiro da esq. para direita, entre Olívio Dutra e Jacob Bittar. Foto: Fund. Perseu Abramo
Duas datas do passado, vizinhas no calendário do mês de fevereiro, permitem especulações sobre o futuro. Em 10 de fevereiro, o Partido dos Trabalhadores comemora 35 anos de sua fundação, à época saudável renovação do quadro partidário nacional. Em 17 de fevereiro, a Itália celebra 23 anos do início da operação Mãos Limpas, investigação profunda e embasada que levou ao desaparecimento dos cinco maiores partidos do país.
O que uma coisa tem haver com outra? Primeiro é difícil imaginar quantos anos o PT levará para se refazer institucionalmente da quantidade de acusações contra sua cúpula a partir da Operação Lava a Jato, maior, mais escandalosa e mais investigada do que o Mensalão. Segundo, se a Lava a Jato for concluída de forma técnica e comprobatória, pode dizimar o quadro partidário brasileiro, como ocorreu na Itália. Este é um efeito desejado, de acordo com os relatos até aqui.
Em depoimento concedido em acordo de colaboração judicial, Pedro José Barusco Filho, ex-gerente de engenharia da Petrobras, estimou que o PT tenha recebido entre US$ 150 milhões e US$ 200 milhões entre 2003 e 2013 de propina retirada dos 90 maiores contratos da Petrobras, como o da refinaria Abreu e Lima, em construção em Pernambuco. Barusco afirmou que o tesoureiro do partido, João Vaccari Neto, teve “participação” no recebimento desse suborno. Vaccari Neto, de acordo com ele, ficou, até março de 2013, com US$ 4,5 milhões. Segundo Barusco, Vaccari participou pessoalmente de um acerto fechado entre funcionários da Petrobras e estaleiros nacionais e internacionais relativos a 21 contratos para construção de navios equipados com sondas, contratações que envolveram ao todo cerca de US$ 22 bilhões. O depoimento foi prestado no dia 20 de novembro último e veio à tona nesta quinta-feira.
“Há tentativa de criminalizar o PT”, rebateu o presidente do partido, Rui Falcão. Por nota, o PT afirmou que as acusações de Barusco “não apresentam provas ou sequer indícios de irregularidades e, portanto, não merecem crédito”. É o terceiro depoimento, fruto de colaboração com a Justiça, acusando diretamente o partido. A imprecisão do valor que o PT possa ter recebido (entre US$ 150 milhões e US$ 200 milhões) impressiona. Ou pela falta de acuidade da informação (afinal uma diferença de US$ 50 milhões não é um arredondamento) ou porque ainda há mais a se descobrir do que possa se imaginar.
Que a divulgação da acusação surja às vésperas da comemoração dos 35 anos do partido serve para estimular a teoria conspiratória de perseguição da mídia e do Ministério Público. Mas já se tornou insuficiente para quem deseja que os processos da Lava a Jato se tornem purgatórios na política brasileira e levem a um salto qualitativo nas práticas administrativas e partidárias.
Pode-se dizer que o PT está morto? De acordo com dados do TSE, o PT tinha em 2002 829 mil filiados. Foi o ano da eleição de Lula. O partido chegou à reeleição de Dilma com 1,590 milhão de filiados, crescimento de 92%. Com base de comparação, o PMDB tinha 2,200 milhões de filiados e passou para 2,356 milhões (+ 6%) e o PSDB foi de 1,050 milhão para 1,351 milhão (+ 29%), no mesmo período.
Os anos do poder ampliaram as filiações ao partido, mas sua burocracia parece cada vez mais afeita a negócios do que a política. Isto sim pode aniquilar o PT.
Na Itália, um grupo de cinco promotores conduziu por dois anos uma investigação da qual resultaram 1.300 condenações e penas negociadas, e 150 absolvições cabais, fora as prescrições.
Houve episódios dramáticos como a “estação de suicídios” de vários empresários e políticos de relevo, a fuga e a morte no exílio do ex-primeiro-ministro Bettino Craxi, o desaparecimento de cinco dos maiores partidos -entre eles a Democracia Cristã, que governara o país durante décadas. O abalo produzido pela “revolução dos juízes” acabou por destruir a Primeira República italiana, dando nascimento a partidos e movimentos improvisados, como a Liga Norte ou a Força Itália.
Não se pode negar que foi feita justiça, imperfeita como sempre, por meios judiciários regulares ou pela morte política.
Mario Pedrosa, no dia da fundação do PT em 10 de fevereiro de 1980, escreveu um manifesto tornado clássico na recente história política brasileira: “Partido de massa não tem vanguarda, não tem teorias, não tem livro sagrado. Ele é o que é, guia-se por sua prática, acerta por seu instinto. Quando erra, não tem dogmas e pela autocrítica refaz seu erro.”
Em 14 de fevereiro de 1980, quatro dias depois da fundação do PT, o economista Paul Singer escreveu na Folha de S.Paulo: “Nascendo de movimentos da sociedade civil, que procuram se exprimir através dele, sem subordinar suas lutas específicas à atividade partidária, o PT dificilmente será dominado por sua cúpula parlamentar ou burocrática. A sua viabilidade dependerá da vitalidade dos movimentos sociais que lhe dão origem. Não é descabido supor que esta vitalidade continuará em ascensão, alimentada que é por contradições sociais que não cessam de se agravar”.
Pedrosa e Singer são insuspeitos conselheiros que o PT precisa retomar, se quiser sobreviver. Fazer a autocrítica e voltar-se contra o domínio da cúpula parlamentar e burocrática em favor da revitalização de movimentos socais que podem lhe reorientar o papel. Se não o fizer, o vermelho de sua bandeira sangrará em morte lenta em praça pública.
Plínio Fraga
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